Alfabetização e escolarização: a instituição do letramento escolar

SANTOS, Carmi Ferraz. Alfabetização e letramento: conceitos e relações / organizado por Carmi Ferraz Santos e Márcia Mendonça. 1ed. 1reimp. – Belo Horizonte: Autêntica, 2007 p. 23-35.

Alguns “pesquisadores voltados para discussões sobre o letramento têm questionado essa visão da alfabetização popular como meramente um produto desse processo de escolarização de massa impulsionado pela industrialização” (SANTOS, p. 24)                      Com o “desenvolvimento de uma sociedade industrial e urbana que vai aos poucos substituindo o antigo regime baseado numa economia rural e agrária. Com o estabelecimento de uma nova ordem econômico-social, a exigência de uma instrução universal torna-se premente”. (SANTOS, p. 24)

Com isso “entretanto, apesar de se poder estabelecer relação linear e causal entre a industrialização e a constituição de uma escola universal, não se pode afirmar que, a partir do século XVIII, passou-se do total analfabetismo para a alfabetização graças apenas à escolarização”. (SANTOS, p. 25)

A autora  “Investigando a cultura popular na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos e na Europa, diferentes pesquisadores revelaram a presença de cartas pessoais, diários, notas, registros, livros, folhetos e almanaques como parte essencial da vida cotidiana das populações já no século XVIII, tanto na cidade quanto no campo”. (SANTOS, p. 25)


Com “os movimentos populares ligados à Reforma Protestante promoveram a difusão da instrução como meio de garantir a leitura e a interpretação da Bíblia por cada fiel”. (SANTOS, p. 26)

Entretanto “não apenas a Reforma, mas também o movimento de Contra-Reforma, buscou a instrução de seus fiéis como forma de introduzi-los na verdade da fé católica” (SANTOS, p. 26)

Nesta perspectiva a autora traz “Uma visão otimista e a favor da instrução pública não foi a princípio um consenso. Durante o final do século XVIII e início do XIX, alguns políticos e alguns líderes religiosos acreditavam que permitir a escolarização para toda a população levaria à perda de controle sobre ela”. (SANTOS, p. 27)

Sendo que “Essa alfabetização levada a efeito por meio da escolarização teve por base um processo de ensino no qual a capacidade de ler e escrever foi sendo associada a características morais e sociais. Isso levou a uma nova divisão da sociedade entre os educados (escolarizados) e os não-educados (não-escolarizados)”. (SANTOS, p. 28) 

“A aprendizagem da língua escrita assume, a partir da escolarização formal, um caráter de alfabetização escolar, passando a considerar como verdadeiramente alfabetizado apenas o sujeito que passasse pela escola. à medida que o processo de escolarização estava sendo implantado, as práticas populares passaram a ser controladas, modificadas ou substituídas”. (SANTOS, p. 28)

“Essa relação de domínio da escolarização sobre a alfabetização popular trouxe profundas consequências para a aprendizagem da escrita e da leitura”. (SANTOS, p. 28-29)
“Uma das primeiras consequências dessa relação que passa a se estabelecer entre a alfabetização e a escolarização foi a instituição de um processo de alfabetização distanciado dos usos e do material de leitura e de escrita presentes no cotidiano das pessoas”. (SANTOS, p. 29)
Teve-se as “Consequência da escolarização do processo de alfabetização resulta do próprio caráter teleológico que a escola tem assumido desde suas origens”. (SANTOS, p. 30)

“Embora estejamos falando do processo de escolarização da alfabetização iniciado entre os séculos XVIII e XIX, essa forma de se estruturar o processo de aquisição da língua escrita parece ainda ser algo bem presente e nos lembra as cartilhas utilizadas ainda hoje”. (SANTOS, p. 31)

“Assim como os mestres dos séculos XVIII e XIX, muitos professores ainda hoje concebem o ato de ler e escrever como algo neutro e universal e acreditam que o problema fundamental da alfabetização é uma questão de escolha do método a ser utilizado”. (SANTOS, p. 32)
“As análises dos estudos mencionados nos levam a perceber o quanto a noção ampliada de alfabetização do século XVIII, que considerava as práticas de letramento efetivamente produzidas no cotidiano das pessoas comuns, foi abandonada, em favor de práticas de letramento eminentemente escolar”. (SANTOS, p. 33)


“Entretanto, não se pode negar o papel que a escola exerce hoje em nossa sociedade e que, para muitos indivíduos, ela seja, talvez, o único meio de acesso à aprendizagem sistemática da escrita”. (SANTOS, p. 33)


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