O pensamento de Emilia Ferreiro sobre alfabetização
MELLO, Márcia
Cristina de Oliveira. O pensamento de Emilia Ferreiro sobre alfabetização. Revista
Moçambras: acolhendo a alfabetização nos países de língua portuguesa, São
Paulo, ano 1, n. 2, 2007. Disponível em: <http://www.mocambras.org>.
Publicado em: março 2007.
Foi
a partir dos “anos de 1980 são divulgados, no Brasil, os resultados dos estudos
realizados pela pesquisadora argentina, Emilia Ferreiro, e seus colaboradores,
contendo uma nova abordagem do processo de aquisição da língua escrita pela
criança”. (MELLO,2007, p.85).
Com
isso “Dada a importância do pensamento dessa pesquisadora, é preciso
compreendê-lo de um ponto de vista histórico: qual o seu significado, o que
representou e o que representa para a história da alfabetização no Brasil?” (MELLO,2007,
p.86).
No
qual “Essas constatações fizeram-me confirmar meu interesse de pesquisa inicial
e eleger como corpus para análise o livro Psicogênese da língua escrita,
escrito por Emilia Ferreiro e Ana Teberosky, traduzido, no Brasil, em 1985”.
(MELLO,2007, p.87).
“Emilia
Ferreiro ganhou prestígio por desenvolver, com seus colaboradores, pesquisa
empírica que lhe permitiu formular a teoria sobre a psicogênese da língua
escrita, a qual foi divulgada em diversos países, dentre eles, o Brasil. Sua
atuação profissional revela, também, o compromisso político em contribuir na
busca de soluções para se enfrentar o problema do analfabetismo”. Sendo que “Ferreiro
afirma ter feito uma ―revolução conceitual‖ a respeito da alfabetização, por
ter ―mudado‖ o eixo em torno do qual passavam as discussões sobre o tema: dos
debates sobre os métodos e os testes utilizados para o ensino da leitura e da
escrita para a idéia de que não são os métodos que alfabetizam, nem os testes
que auxiliam o processo de alfabetização, mas são as crianças que (re)constroem
o conhecimento sobre a língua escrita, por meio de hipóteses que formulam, para
compreenderem o funcionamento desse objeto de conhecimento”. (MELLO,2007,
p.87).
“Desde
o início da divulgação do pensamento construtivista de Emilia Ferreiro sobre
alfabetização em nosso país, em meados dos anos de 1980, as tensões decorrentes
da apropriação desse pensamento no âmbito de propostas oficiais estavam
relacionadas com as discussões sobre o significado da ―revolução conceitual‖
proposta por Emilia Ferreiro”. (MELLO,2007, p.88).
“A
análise de Psicogênese da língua escrita propiciou confirmar sua relevância no
que se refere à compreensão do pensamento construtivista de Emilia Ferreiro
sobre alfabetização. Essa importância deriva justamente do fato de nele estar
contida o que denomino ―matriz invariante‖ desse pensamento, considerado pelas
autoras do livro, como já mencionei, e por outros pesquisadores, uma ―revolução
conceitual‖ em alfabetização”. (MELLO,2007, p.90).
Nos
textos escritos posteriormente por Ferreiro, observa-se que a pesquisadora vai
expandindo essa matriz de seu pensamento. Neles, a pesquisadora amplia e
aprofunda as primeiras formulações sobre a teoria da psicogênese da língua
escrita, conciliando relatos de situações e resultados de investigações
desenvolvidas sobre a aprendizagem da língua escrita, seja por parte de
crianças, seja por parte de adultos, seja por parte de povos indígenas. (MELLO,2007,
p.91).
“Por
fim, vale enfatizar que, depois das tensões iniciais decorrentes da divulgação desse
pensamento – cuja matriz invariante se encontra no livro analisado – e dos
questionamentos por alguns estudiosos do assunto, ele permanece atuante, até os
dias de hoje, nos discursos e nas práticas de alfabetização no Brasil”. (MELLO,2007,
p.91-92).
Alfabetização e escolarização: a instituição do letramento escolar
SANTOS, Carmi Ferraz. Alfabetização e letramento: conceitos e
relações / organizado por Carmi Ferraz Santos e Márcia Mendonça. 1ed. 1reimp.
– Belo Horizonte: Autêntica, 2007 p. 23-35.
Alguns
“pesquisadores voltados para discussões sobre o letramento têm questionado essa
visão da alfabetização popular como meramente um produto desse processo de
escolarização de massa impulsionado pela industrialização” (SANTOS, p. 24) Com o “desenvolvimento de
uma sociedade industrial e urbana que vai aos poucos substituindo o antigo regime
baseado numa economia rural e agrária. Com o estabelecimento de uma nova ordem
econômico-social, a exigência de uma instrução universal torna-se premente”. (SANTOS,
p. 24)
Com
isso “entretanto, apesar de se poder estabelecer relação linear e causal entre
a industrialização e a constituição de uma escola universal, não se pode
afirmar que, a partir do século XVIII, passou-se do total analfabetismo para a
alfabetização graças apenas à escolarização”. (SANTOS, p. 25)
A
autora “Investigando a cultura popular
na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos e na Europa, diferentes pesquisadores
revelaram a presença de cartas pessoais, diários, notas, registros, livros,
folhetos e almanaques como parte essencial da vida cotidiana das populações já
no século XVIII, tanto na cidade quanto no campo”. (SANTOS, p. 25)
Com
“os movimentos populares ligados à Reforma Protestante promoveram a difusão da
instrução como meio de garantir a leitura e a interpretação da Bíblia por cada fiel”.
(SANTOS, p. 26)
Entretanto
“não apenas a Reforma, mas também o movimento de Contra-Reforma, buscou a
instrução de seus fiéis como forma de introduzi-los na verdade da fé católica” (SANTOS,
p. 26)
Nesta
perspectiva a autora traz “Uma visão otimista e a favor da instrução pública
não foi a princípio um consenso. Durante o final do século XVIII e início do
XIX, alguns políticos e alguns líderes religiosos acreditavam que permitir a
escolarização para toda a população levaria à perda de controle sobre ela”.
(SANTOS, p. 27)
Sendo
que “Essa alfabetização levada a efeito por meio da escolarização teve por base
um processo de ensino no qual a capacidade de ler e escrever foi sendo
associada a características morais e sociais. Isso levou a uma nova divisão da
sociedade entre os educados (escolarizados) e os não-educados
(não-escolarizados)”. (SANTOS, p. 28)
“A
aprendizagem da língua escrita assume, a partir da escolarização formal, um
caráter de alfabetização escolar, passando a considerar como verdadeiramente
alfabetizado apenas o sujeito que passasse pela escola. à medida que o processo
de escolarização estava sendo implantado, as práticas populares passaram a ser
controladas, modificadas ou substituídas”. (SANTOS, p. 28)
“Essa
relação de domínio da escolarização sobre a alfabetização popular trouxe
profundas consequências para a aprendizagem da escrita e da leitura”. (SANTOS,
p. 28-29)
“Uma
das primeiras consequências dessa relação que passa a se estabelecer entre a
alfabetização e a escolarização foi a instituição de um processo de
alfabetização distanciado dos usos e do material de leitura e de escrita
presentes no cotidiano das pessoas”. (SANTOS, p. 29)
Teve-se
as “Consequência da escolarização do processo de alfabetização resulta do
próprio caráter teleológico que a escola tem assumido desde suas origens”. (SANTOS,
p. 30)
“Embora
estejamos falando do processo de escolarização da alfabetização iniciado entre
os séculos XVIII e XIX, essa forma de se estruturar o processo de aquisição da
língua escrita parece ainda ser algo bem presente e nos lembra as cartilhas
utilizadas ainda hoje”. (SANTOS, p. 31)
“Assim
como os mestres dos séculos XVIII e XIX, muitos professores ainda hoje concebem
o ato de ler e escrever como algo neutro e universal e acreditam que o problema
fundamental da alfabetização é uma questão de escolha do método a ser utilizado”.
(SANTOS, p. 32)
“As
análises dos estudos mencionados nos levam a perceber o quanto a noção ampliada
de alfabetização do século XVIII, que considerava as práticas de letramento
efetivamente produzidas no cotidiano das pessoas comuns, foi abandonada, em
favor de práticas de letramento eminentemente escolar”. (SANTOS, p. 33)
“Entretanto,
não se pode negar o papel que a escola exerce hoje em nossa sociedade e que,
para muitos indivíduos, ela seja, talvez, o único meio de acesso à aprendizagem
sistemática da escrita”. (SANTOS, p. 33)
Conceituando alfabetização e letramento
ALBUQUERQUE,
Eliana Borges Correia de. Conceituando alfabetização e letramento. In: SANTOS,
C. F.; MENDONÇA, M. (Org.). Alfabetização
e letramento: Conceitos e
relações. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.p. 11-22.
Para
autora “A alfabetização considerada como o ensino das habilidades de “codificação”
e “decodificação” foi transposta para a sala de aula, no final do século XIX,
mediante a criação de diferentes métodos de alfabetização – métodos sintéticos
(silábicos ou fônicos) x métodos analíticos (global) –, que padronizaram a
aprendizagem da leitura e da escrita”. (ALBUQUERQUE, p. 11).
Com isso “A
maioria de nós, que passamos pela alfabetização até as décadas finais do século
passado, também teve uma experiência escolar com ênfase na “codificação” e ‘decodificação”.
(ALBUQUERQUE, p. 12).
Com
isso na “ década de 1980, o ensino da leitura e da escrita centrado no
desenvolvimento das referidas habilidades, desenvolvido com o apoio de material
pedagógico que priorizava a memorização de sílabas e/ou palavras e/ou frases
soltas, passou a ser amplamente criticado”. (ALBUQUERQUE, p. 15)
Pesquisa
feita “No campo da Psicologia, foram muito importantes as contribuições dos
estudos sobre a psicogênese da língua escrita, desenvolvidos por Emília
Ferreiro e Ana Teberosky (1984). as autoras defenderam uma concepção de língua
escrita como um sistema de notação que, no nosso caso, é alfabético”. (ALBUQUERQUE,
p. 15)
No
processo de apropriação do sistema de escrita alfabética, os alunos precisariam
compreender como esse sistema funciona e isso pressupõe que descubram que o que
a escrita alfabética nota no papel são os sons das partes orais das palavras e
que o faz considerando segmentos sonoros menores que a sílaba. (ALBUQUERQUE, p.
16)
No
entanto “o discurso da importância de se considerar os usos e funções da língua
escrita com base no desenvolvimento de atividades significativas de leitura e
escrita na escola foi bastante difundido a partir da década de oitenta”, de
“analfabetismo funcional” para caracterizar aquelas pessoas que, tendo se
apropriado das habilidades de “codificação” e “decodificação”, não conseguiam
fazer uso da escrita em diferentes contextos sociais”. (ALBUQUERQUE, p. 16)
No
Brasil, o termo letramento não substituiu a palavra alfabetização, mas aparece
associada a ela. (ALBUQUERQUE, p. 16)
Porem
“Por outro lado, o domínio do sistema alfabético de escrita nãogarante que
sejamos capazes de ler e produzir todos os gêneros de texto”, “mesmo em países
desenvolvidos onde o índice de analfabetismo é praticamente inexistente, o
fenômeno do letramento passou a ser amplamente discutido”, sendo que no qual “os
alunos saem da escola com o domínio das habilidades inadequadamente denominadas
de “codificação” e “decodificação”, mas são incapazes de ler e escrever
funcionalmente textos variados em diferentes situações”. (ALBUQUERQUE, p. 17-18)
“As
práticas de leitura e produção de textos desenvolvidas na escola, relacionadas
a um “letramento escolar”, não se adequaria, conforme certas expectativas, ao
desenvolvimento socioeconômico-cultural de nossa sociedade, em que os
indivíduos convivem em contexto sem que a escrita se faz presente de forma mais
complexa”. (ALBUQUERQUE, p.18)
“Sabemos
que, para a formação de leitores e escritores competentes, é importante a
interação com diferentes gêneros textuais, com base em contextos diversificados
de comunicação”. “é imprescindível que os alunos desenvolvam autonomia para ler
e escrever seus próprios textos”. (ALBUQUERQUE, p.19)
“A
leitura e a produção de diferentes textos são tarefas imprescindíveis para a
formação de pessoas letradas”. “É preciso ler e
produzir textos diferentes para atender a finalidades diferenciadas, a fim de
que superemos o ler e a escrever para apenas aprender a ler e a escrever”. “Por outro lado, um trabalho sistemático de
reflexão sobre o sistema de escrita alfabético não pode ser feito apenas
através da leitura e da produção de textos, é preciso o desenvolvimento de um
ensino no nível da palavra, que leve o, aluno
a perceber que o que a escrita representa (nota no papel) é sua pauta sonora, e
não o seu significado, e que o faz através da relação fonema/grafema”.
(ALBUQUERQUE, p.20)
Fichamento: Psicogênese da Língua Escrita
MENDONÇA, Onaide Schwartz; MENDONÇA,
Olympio Correa de. Psicogênese da Língua
Escrita: contribuições, equívocos e consequências para a
alfabetização. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA. Pró-Reitoria de
Graduação. Caderno de formação: formação de professores: Bloco 02: Didática dos
conteúdos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011. v. 2. p. 36-57. (D16 - Conteúdo
e Didática de Alfabetização). Disponível em:
<http://acervodigital.unesp.br/handle/123456789/40138>.
1. Contribuições da Psicogênese da Língua Escrita
Ferreiro e Teberosky, psicolinguistas
argentinas, iniciaram em 1974 uma investigação, partindo da concepção de que a
aquisição do conhecimento se baseia na atividade do sujeito em interação com o
objeto de conhecimento e demonstraram que a criança, já antes de chegar à
escola, tem ideias e faz hipóteses sobre o código escrito, descrevendo os
estágios linguísticos que percorre até a aquisição da leitura e da escrita. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.37).
Essa teoria, formulada e comprovada
pelas duas pesquisadoras, foi divulgada pela sua primeira obra publicada no
Brasil, em 1986, a Psicogênese da língua escrita. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.37).
Assim, Ferreiro e Teberosky
desenvolveram sua pesquisa com fundamentos psicolinguísticos quando
recapitulam o construtivismo, deixando claro que a teoria piagetiana acumulava
pesquisas insuficientes para dar conta da linguagem, tendo aí um papel marginal
na constituição das competências cognitivas, fazendo com que buscassem, na
Psicolinguística, fundamentos para a investigação da Psicogênese da língua
escrita. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.37).
A descoberta do processo de aquisição
da língua escrita, por crianças, levou Ferreiro (1983) a indagar se sua
pesquisa aplicada a adultos analfabetos encontraria os mesmos resultados. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.38).
A pesquisa mostrou que o analfabeto
adulto, assim como as crianças, sabem, mesmo antes de vir para a escola, que a
escrita é um sistema de representação e fazem hipóteses de como se dá tal
representação. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa
p.38).
Ferreiro e Teberosky (1986)
desenvolvem também aspectos propriamente linguísticos da Psicogênese da língua
escrita, quando descrevem o aprendiz formulando hipóteses a respeito do código,
percorrendo um caminho que pode ser representado nos níveis pré-silábico, silábico,
silábico-alfabético, alfabético. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA,
Olympio Correa p.38).
A Psicogênese da
língua escrita descreve como o aprendiz se apropria dos conceitos e das
habilidades de ler e escrever, mostrando que a aquisição desses atos linguísticos
segue um percurso semelhante àquele que a humanidade percorreu até chegar ao
sistema alfabético, ou seja, o aluno, na fase pré-silábica do caminho que
percorre até alfabetizar-se, ignora que a palavra escrita representa a palavra
falada, e desconhece como essa representação se processa. Ele precisa, então,
responder a duas questões: o que a escrita representa e o modo de construção
dessa representação. No nível pré-silábico, em um primeiro momento, o
aprendiz pensa que pode escrever com desenhos, rabiscos, letras ou outros
sinais gráficos, imaginando que a palavra assim inscrita representa a coisa a
que se refere. Há um avanço, quando se percebe que a palavra escrita representa
não a coisa diretamente, mas o nome da coisa. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa
p.39).
Assim, a passagem para o nível
silábico é feita com atividades de vinculação do discurso oral com o texto
escrito, da palavra escrita com a palavra falada. . (MENDONÇA, Onaide Schwartz e
MENDONÇA, Olympio Correa p.39).
2. Equívocos da Interpretação da
Psicogênese da Língua Escrita
Deste modo, retomando a apresentação
anterior, reafirmamos que o construtivismo, com base na Psicogênese da
língua escrita, teoria formulada e comprovada experimentalmente por Emília
Ferreiro e Ana Teberosky (1986), há mais de vinte anos foi introduzido no
Brasil, para contribuir na melhoria da qualidade da alfabetização, e adotado
pelos mais importantes sistemas públicos de ensino. (MENDONÇA, Onaide
Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.40).
Eles têm uma tendência obsessiva pela
silabação. E eu fico sem saber como agir quando o professor, ao perceber as
dificuldades das crianças com uma determinada palavra, passa a dividi-la em
sílabas. Eles dizem que isso ajuda a fixação. E eu tenho dúvida se devo
continuar censurando essa atitude. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e
MENDONÇA, Olympio Correa p.40 apud LAGÔA, 1991, p. 17-18).
A escrita é uma
reconstrução real e inteligente, com um sistema de representação historicamente
construído pela humanidade e pela criança que se alfabetiza, embora não
reinvente as letras e os números. A criança alfabetiza a si mesma e inicia essa
aprendizagem antes mesmo de entrar na escola, e seus efeitos prolongam-se após
a ação pedagógica, período durante o qual, para conhecer a natureza da
escrita, deve participar de atividades de produção e interpretação escritas,
tendo o professor o papel de mediador entre a criança e a escrita, criando
estratégias que propiciem o contato do aprendiz com esse objeto social, para
que possa pensar e agir sobre ele. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.41).
Pelo exposto, a didática silábica
merece reparos somente quando trabalhada isoladamente ou quando
prescinde da etapa anterior, a pré-silábica, e se transforma em atividade mecanicista,
ao dissociar-se do significado e do contexto, mesmo porque Emília Ferreiro
não condena didática alguma, não prescreveu métodos, nem os indicou. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.42).
O equívoco que se
configura na exclusão da experiência silábica do professor parece ser fruto de
algumas orientações pedagógicas, surgidas no afã de combater as atividades
mecanicistas herdadas das cartilhas, à revelia da própria obra de Emília
Ferreiro que não oferece elementos para fundamentar tal exigência, mas sim
esclarece que a criança pensa, raciocina, inventa, buscando compreender a
natureza desse objeto cultural – a escrita – em um processo dinâmico em
constante construção de sistemas interpretativos. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e
MENDONÇA, Olympio Correa p.43).
Esse debate, para que não se limite
ao âmbito da polêmica, pode concluir-se com o pressuposto de que a
alfabetização deve ser significativa, isto é, contextualizada. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.43).
3. Consequências dos Equívocos da
Interpretação da Psicogênese da Língua Escrita
Na elaboração das
Propostas, sob forte impacto das descobertas de Ferreiro e Teberosky (1986),
houve uma tentativa de metodização da Psicogênese da língua escrita, ou seja,
os organizadores de tais propostas tentaram, à luz da teoria, criar um método
revolucionário, inovador de alfabetização, muito diferente do método das
cartilhas utilizado durante décadas em nosso país. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e
MENDONÇA, Olympio Correa p.45).
Evidentemente, nem
o construtivismo, nem a Psicogênese da língua escrita são métodos, mas ainda
hoje é comum, ao se questionar um alfabetizador sobre qual é seu método de
ensino, obter-se a resposta: “método construtivista”. (MENDONÇA, Onaide
Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.45).
a confusão inicial
se deu por conta da própria definição de alfabetização. Definir alfabetização e
letramento é de suma importância, pois são dois processos distintos e da sua
compreensão dependerão os resultados da alfabetização em sala de aula. Assim,
compreender a natureza de cada processo é essencial, pois só de posse desse
conhecimento o professor terá condições de decidir sua metodologia de ensino,
em função dos objetivos a serem alcançados. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e
MENDONÇA, Olympio Correa p.45).
É importante que o
alfabetizador desenvolva, em sala, as sugestões de atividades indicadas pelo
construtivismo, entretanto, a especificidade da alfabetização não pode ser
esquecida e relegada a segundo plano, pois nela existem elementos que irão
garantir ao aluno o domínio da base alfabética e, portanto, a compreensão do
sistema de escrita. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.46).
alfabetizar significa
ensinar uma técnica, a técnica do ler e escrever. Quando o aluno lê, realiza a
decodificação (decifração) de sinais gráficos, transformando grafemas em
fonemas; quando ele escreve, codifica, transformando fonemas em grafemas. Esse
é um aprendizado complexo, que exige diferentes formas de raciocínio, envolvendo
abstração e memorização. A escrita é uma convenção e, portanto, precisa ser
ensinada. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.46).
Letrar é uma
tarefa extremamente ampla que, por definição, envolve habilidades múltiplas de
ler, interpretar e produzir textos adequados às exigências sociais. Assim, em
princípio, tal atividade engloba os mais diferentes gêneros textuais, portanto
é atitude ingênua pensar que, lendo apenas histórias infantis, poemas ou
parlendas, iremos letrar alguém.
(MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.47).
O grande equívoco
que vem ocorrendo na alfabetização, no Brasil, resulta da concepção equivocada
e das práticas adotadas e divulgadas, decorrentes da má interpretação da
pesquisa de Ferreiro e Teberosky, a Psicogênese da língua escrita. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.47).
A alfabetização diluída e inconclusa
no processo de letramento, como vem sendo feito, é inaceitável, todavia os
resultados das avaliações sobre leitura e interpretação de texto demonstram,
hoje, que, além da conduta exclusiva “construtivista”, não conseguir
alfabetizar representa incompetência também para letrar. (MENDONÇA,
Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.48).
Um outro equívoco
divulgado à época era o de que o professor não precisava ensinar, porque a
criança aprendia sozinha. Dizia-se, também, que o professor não precisava
desenvolver um trabalho sistemático de alfabetização, pois deveria exercer a
função de “mediador” do conhecimento (papel que não ficava claro aos professores),
informando apenas o que os alunos, ao demonstrar interesse, questionassem. Se o
docente limitar-se a responder questionamentos de alunos, a aprendizagem da
leitura e da escrita poderá ficar comprometida. Alfabetizar exige trabalho
sistemático com objetivos determinados, com carga horária diária, concentração,
esforço, persistência e determinação. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA,
Olympio Correa p.49).
Hoje,
dificilmente, se encontram professores que conseguem desenvolver um trabalho
sistematizado. Infelizmente, a maioria limita-se a reproduzir as estratégias
de nível pré-silábico de modo aleatório, muitas vezes entregam a atividade sem
fornecer orientações sobre o que é para ser feito, mesmo quando dão a resposta,
fazem isso antes de o aluno refletir sobre o assunto. (MENDONÇA, Onaide
Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.50).
Portanto, não é difícil compreender o
“fenômeno” que vem ocorrendo em Pré-escolas por este país. Em pesquisa
circunstanciada, em rede municipal, verificou-se que os alunos ingressam no
Pré I, aos quatro anos de idade, apresentando amostras de escrita pré-silábica;
nos anos seguintes, passam pelo Pré II, Pré III e mais de 68% ingressam no
primeiro Ciclo (antiga primeira série, atual 2° ano) apresentando, ainda,
amostras de escrita pré-silábica, ou seja, estes não avançaram em seus
conhecimentos sobre escrita. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA,
Olympio Correa p.50).
A pesquisa de Ferreiro e Teberosky
tem como mérito, para a alfabetização, a revelação dos níveis e das hipóteses
que são elaboradas pelo alfabetizando, em seu processo de construção e
aquisição da escrita. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio
Correa p.54).
Como a teoria
construtivista afirma que é o sujeito que constrói seu conhecimento, o professor
não pode intervir: enfim, há a concepção equivocada, entre “intelectuais de
gabinete” da educação, de que se a conduta na alfabetização for construtivista,
o professor não poderá intervir com atividades que ajudem o aluno a avançar,
alegando que, se a criança é o sujeito do conhecimento, é preciso deixar que
avance sozinha. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e MENDONÇA, Olympio Correa p.55).
Talvez este
equívoco seja o maior responsável pelo atual fracasso na aprendizagem da leitura
e da escrita. É como se houvesse uma cortina de fumaça que impedisse a visão,
ou como se alguém tivesse realizado uma lavagem cerebral nos responsáveis pelas
divulgações de tais concepções, já que é inconcebível ao alfabetizador aplicar
frequentemente avaliações diagnósticas para verificação dos níveis dos alunos
e permanecer de mãos atadas sem poder ajudá-los. (MENDONÇA, Onaide Schwartz e
MENDONÇA, Olympio Correa p.55).
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